Precisamos de pouco: precisamos de critério


A diretoria do Cruzeiro tem trabalhado em silêncio na reformulação do elenco para 2016. A fala é de poucos e pontuais reforços, mas também de espanto com os altos valores do mercado, especialmente o nacional. De fato, a situação celeste não é fácil. Ganharemos 60 milhões de verba da TV na próxima temporada. Por sua vez, Flamengo e Corinthians receberão 170 milhões, cada. E a imprensa seguirá tratando este abismo como normal, dizendo que a diretoria rubro-negra é exemplar no cumprimento de seus compromissos e no saneamento do clube. E que Tite é o principal responsável pelo título brasileiro do Corinthians, mesmo tendo a sua disposição um elenco com 12 jogadores com passagem pela seleção brasileira (nenhum deles cria do clube, ou seja, todos contratados por altos valores).

A análise, portanto, é fraca. Para o Cruzeiro ter responsabilidade financeira é mais difícil e para contratar jogadores com passagem pela seleção também. O mercado é inflacionado, mas é mais para uns e menos para os outros. Se os clubes usarem a grana da TV apenas para pagar os salários de seus jogadores, o Flamengo pode ter uma folha mensal de 14 milhões de reais e usar suas outras receitas para o resto de seus compromissos. O Cruzeiro, por sua vez, só consegue com a verba da TV custear uma folha de 5 milhões mensais e precisa de outras receitas para complementar o excesso.

Pagar 450 mil mensais para tirar o Jean do Fluminense, por exemplo, parece um absurdo para nossas contas. Para o Palmeiras, cuja cota de TV sustenta uma folha de 8,3 milhões, já parece mais possível. A realidade financeira nestas horas grita alto. No mercado brasileiro, o Cruzeiro não terá vida fácil se quiser tirar destaques dos principais rivais. Qual a alternativa?

Ter critério, eu diria. E, principalmente, evitar o risco. O diretor de futebol Thiago Scuro tem na frase “evitar o erro” uma máxima constante em suas entrevistas. E está certo. E evitar o erro passa, também, por não fazer muitas apostas. Os nomes especulados até aqui agradam, mas são nomes para se avaliar. Sanchez Miño, Cuellar, Pisano e Douglas Coutinho são boas contratações? Valem o investimento?

Em 2015, o Cruzeiro jogou dinheiro fora de maneira irresponsável. Não gastou 450 mil mensais em jogadores como Jean, mas trouxe Damião, que sozinho já custava mais que isso, e trouxe uma barca que não deu certo: Paulo André, Seymour, Riascos, Marinho e Joel. Jogadores de pouco brilho na carreira ou notadamente em baixa. Investimentos de alto risco. Que custaram caro e não jogaram metade das partidas do clube no ano, quando muito.

A barca furada de 2015 (Foto: Washington Alves / Cruzeiro / Light Press)

A apresentação de alguns elementos da ‘barca furada’ de 2015 (Foto: Washington Alves / Cruzeiro / Light Press)

Dos nomes especulados para 2016, é importante perceber que Douglas Coutinho é um jogador de muito potencial, mas sua saída não é lamentada pela torcida do Atlético-PR. Sanchez Miño não foi aproveitado no Torino e vai para o segundo empréstimo, além de atuar na função do Cabral, ou seja, não é uma função carente no elenco (pode atuar como lateral-esquerdo, onde brigaria para ser titular). São, portanto, ao menos para o leigo, duas grandes interrogações.

Pisano tem 24 anos e atua pela direita. Dos especulados, é o mais próximo de chegar e ocupar a titularidade. Cuellar tem 23 anos e faz suas primeiras aparições na seleção colombiana. Investidas importantes no mercado sul-americano. Mas fica aquela interrogação. Por que não saíram para o exterior antes? (Lembrando que a Europa, por exemplo, leva os bons valores sul-americanos bem mais cedo).

Sei que muita gente vai achar que os apontamentos do texto são contra a diretoria cruzeirense e mandar o famoso “não é melhor esperar para avaliar?”. Eu não tenho dúvida que é. E, especialmente sobre os gringos, confesso não ter nada para falar por nunca os ter visto jogar. No entanto, ao menos pelo que se especula, o Cruzeiro está indo para a janela de 2016 como foi em 2015. Atrás de apostas. E isto envolve risco, inclusive financeiro. Quatro jogadores baratos que dão errado custam muito mais caro que o “medalhão” que dá certo. Pará e Marinho devem sair e custaram, só em direitos econômicos, 4,5 milhões de reais para o Cruzeiro. Não é nenhum trocado. Em 2013, Ricardo Goulart e Everton Ribeiro, no entanto, também eram apostas. E deram certo, até porque o time tinha jogadores como Dedé, Dagoberto e Fábio para lhes dar respaldo. Receita pronta, portanto, não existe. Mas em um elenco com nomes como Arrascaeta, Marcos Vinícius, Gabriel Xavier e companhia, apostas já existem. Nesta janela, precisamos de pouco e do que faltou em 2015: critério.

Que os atletas contratados não sejam apenas composições baratas, mas contratados com critério. Que o departamento de observação do clube seja escutado e referende todos os nomes que vierem a desembarcar na Toca da Raposa. Que cheguem para ser titulares e preencher os setores carentes da equipe. Lembrando da situação financeira relatada nos primeiros parágrafos, nossa situação não é confortável. Diante disso, fundamental mesmo é que não repitam 2015, pois o barato, algumas vezes, costuma sair caro.